12.2.23

Marina Tsvétaeva

  

Amiga

 

1.

 

É feliz? Nunca mo disse.

Talvez seja melhor assim.

Beijou tantos outros –

donde essa tristeza.

 

Vejo, em si, todas as heroínas

das tragédias de Shakespeare.

Você, infeliz dama, nunca foi

salva por ninguém.

 

Cresceu no cansaço de repetir

as palavras usuais do amor!

Um anel de ferro numa mão exangue

é mais expressivo.

 

Amo-a – como uma tempestade que rebenta

por cima da cabeça – devo confessá-lo;

além disso com ferocidade porque você arde

e morde, e acima de tudo

 

porque as nossas vidas secretas tomam

vários caminhos diversos:

sedução e destino sombrio

são a sua inspiração.

 

A si, meu aquilino demónio,

peço desculpa. Num clarão –

como se sobre o caixão – percebi

que sempre fora demasiado tarde para a salvar.

 

Até tremendo – talvez

sonhe – aí

persiste uma ironia encantadora:

para si, não para ele.

 

(16 Outubro 1914)


Nota: este ciclo de poemas amorosos, intitulado Podruga (Amiga), remete para a breve ligação amorosa entre Marina Tsvétaeva (1892-1941) e Sophia (Sonya) Parnok (1885-1933), poeta, jornalista, tradutora. Sigo a tradução de Elaine Feinstein (Bride of Ice. Select poems, Carcanet Classics, Manchester, 2023) depois de a confrontar com a edição de Zéno Bianu (Insomnie et autres poèmes, Poésie / Gallimard, Paris, 2013), obra de vários tradutores.